Chega de angústia

Eu poderia desejar-lhe um tradicional “Feliz Natal”, mas isso garantiria dois dias de felicidade. Já votos protocolares de “Boas Festas” se estenderiam por uma semana. Por isso, quero desejar a você algo capaz de perdurar por todo um ano: “Chega de angústia!”

Ansiedade e angústia tornaram-se companheiros indesejados. A ansiedade representa um estado de impaciência, de inquietação, um desejo recôndito de antecipar uma decisão, de abreviar uma resposta, de aplacar expectativas.

A angústia é uma sensação de desconforto, um mal-estar físico que oprime a garganta, comprime o diafragma, acelera o pulso, e um mal-estar psíquico que aflige, agoniza, atormenta.

 A ansiedade é um tempo que não chega; a angústia, um tempo que não vai embora.

Amantes que aguardam pelo encontro é ansiedade; relacionamentos desgastados que não terminam é angústia. A espera pelo resultado de um concurso é ansiedade; ter seu nome classificado em uma lista de espera é angústia. A expectativa do primeiro dia de trabalho é ansiedade; o fim do expediente que demora é angústia.

Ficamos angustiados por opção, por força de nossas próprias escolhas, por causa de coisas e pessoas. Assumimos compromissos financeiros que não podemos saldar, adquirimos bens pelos quais não podemos pagar. Compramos o que não precisamos, com o dinheiro que não temos, para mostrar a quem não gostamos uma pessoa que não somos. E angustiante.

De tanto cultivar a ansiedade, de tanto se permitir a angústia, colhemos a depressão. Então lançamos mão de um comprimido e fingimos estar tudo bem.

Por isso, meu convite é para que você dê um basta em sua angústia. Demita de sua vida quem e o que não lhe faz bem. Pode ser um cliente chato ou um fornecedor desatencioso; um amigo supostamente leal, porém, na verdade, um interesseiro contumaz; ou um amor não correspondido.

Tome iniciativas que você tem protelado. Relacione tarefas pendentes e programe datas para conclusão. Limpe gavetas, elimine arquivos desnecessários. Revise sua agenda de contatos e sua coleção de cartões de visita, rejeitando quem você nem mais conhece.

 

Vá ao encontro de quem você gosta para demonstrar-lhe sua afeição. Peça perdão a quem se diz magoado com você, mesmo acreditando não tê-lo feito. Ofereça flores, uma canção, um abraço e um aperto de mãos.

A vida é breve e parece estar cada vez mais curta porque o tempo escorre-nos pelas mãos.  Compromissos inadiáveis, reuniões intermináveis, trânsito insuportável. Cotidiano que sufoca, reprime, deprime.

Caminhar pelas ruas, admirar a lua, contar estrelas, observar o desenho que as nuvens formam no céu. Encontrar amigos, saborear os alimentos, apreciar os filhos. Escolha ficar mais leve, viver com serenidade. Libere o peso angustiante que carrega em suas costas. Viva, não apenas se deixe viver.

Feliz Natal, Boas Festas e chega de angústia no próximo ano e sempre.

Texto de Tom Coelho (resumido): educador, conferencista e escritor com artigos publicados em 17 países. Visite: www.tomcoelho.com.

Post (316) – Dezembro de 2018




A arte da paciência

relogio

Vivemos em um mundo frenético que exige resultados imediatos e ter tudo sob controle. Além de irreais, essas pretensões são danosas.

A palavra paciência deriva do latim patiens, ou seja: o que padece.

Implica sofrimento: o da espera e o da esperança… Ou do desespero.  Vivemos em um mundo frenético, saber, conhecer os resultados, e sofremos enquanto esperamos. Evitar essa dor é o que nos torna impacientes.

A tecnologia: Cria a expectativa do imediatismo— em particular as telecomunicações.  Mas isso pode se tornar uma ilusão e nos levar a considerar como presente algo que ainda está por vir. A expectativa é um sistema fechado que resulta em frustração.

O hábito: Estamos nos acostumando ao imediatismo, evitando a espera. Este é um dos segredos da paciência.

Não se nasce paciente. Os bebês choram quando têm fome. Não toleram a insatisfação imediata de uma necessidade primária: o alimento. Pouco a pouco vão aprendendo que, ainda que demore um pouco mais, finalmente lhe darão de comer. Impacientam-se, mas com o tempo aceitam, sem chorar, o sofrimento da fome, porque sabem que o alimento chegará. A natureza da criança é a impaciência, porque poucas coisas dependem delas, porque quase nada está sob seu controle.

O controle: Outro segredo da paciência.

Os poderosos não esperam. Deposita em você a satisfação da urgência, a responsabilidade por conseguir o objetivo

Cada vez conseguimos controlar mais situações. O tempo que vai fazer no lugar remoto ao qual programamos uma viagem ou onde está nossa filha adolescente que demora 10 minutos a mais do que o habitual para chegar em casa. Sem dúvida, grandes avanços, mas habituar-se ao controle fomenta a impaciência. A paciência tem de ser treinada, aprendendo a tolerar o sofrimento causado pelo desconhecimento, a incerteza, o descontrole.

Na sociedade do imediatismo, a satisfação de um desejo de forma quase automática se tornou uma nova droga sem nome. No cérebro, funciona mediante dois mecanismos básicos: de um lado, proporciona prazer, reforça os circuitos de recompensa e fomenta a busca, novamente, da sensação prazenteira oferecida pelo cumprimento do objetivo, quanto antes melhor; de outra, colocam em andamento mecanismos para evitar a dor, como acontece quando algo nos incomoda e mudamos – inconscientemente às vezes— de postura.

O problema é que o corpo não está preparado para estar em situação de alerta constante. Desgasta-se. O sono repara o desgaste, mas a cada vez dormimos menos e, pior, muitas vezes em nome da impaciência, pois dedicamos mais horas para conseguir do que para descansar. O conceito de necessidade se desvirtuou, tanto de ser como de saber e de ter. É impossível subtrair, evitar ou resistir à verdadeira necessidade. Falamos dela cada vez com mais facilidade, quando na verdade se trata de desejos. Desejar é mais suportável do que precisar, e a elevação do desejo à categoria de exigência envolve riscos, pois uma carência adiada se torna uma urgência.

Boa parte da responsabilidade pelo aumento do uso de fármacos para o tratamento da ansiedade e depressão vem dessa tendência de não cultivar a arte da paciência. Viver nesse contexto da urgência é, na realidade, mais danoso do que o possível fracasso em objetivos que consideramos necessários.

Para evitar cair na armadilha do desassossego, a primeira coisa a fazer é tomar consciência de que somos impacientes; depois, avaliar que fatores fomentam nossa inquietude e quais nos protegem. A necessidade de ser paciente é vista como sinal de fraqueza. Os poderosos não esperam, mas depositam em você a satisfação de sua urgência, a responsabilidade por atingir —ou não— o objetivo.

A paciência é protetora, nos permite atravessar situações adversas sem fraquejar

Não devemos sucumbir a essa tendência. A paciência não é apatia, nem resignação. Não é falta de compromisso, porque não é estática: quem espera com calma faz isso ativamente, se rebela contra a dificuldade.

O sossego é otimista, pois a espera ativa implica esperança. É coragem, pois fixa o olhar no longo prazo. O impaciente considera que o objetivo é a meta, quando na verdade o objetivo é ponto de partida. A paciência é protetora, pois não fica frustrada diante da eventualidade do imediato: permite-nos atravessar situações adversas sem fraquejar. É força, pois é paciente aquele que foi capaz de domesticar suas paixões. Mas precisamos treiná-la. Acostumar-nos a esperar e aceitar que ter tudo sob controle é, além de impossível, perigoso.

Recapacitar, reorganizar – tanto os tempos como as prioridades—, refletir. Vamos reservar um tempo para observar que algumas coisas podem esperar sem causar sofrimento, e aprender a saborear o prazer da espera.

Dizia santo Agostinho: “A paciência é companheira da sabedoria”.

Fonte: País Semanal ( 13 de maio de 2018) – Mikel Jaso

Post (315) – Novembro de 2018